sábado, março 07, 2009
EM DESTAQUE NO PÚBLICO
Amanda e os outros
pedromexia@gmail.com
A história vem em todos os jornais italianos e ingleses. Na noite de 1 de Novembro de 2007, uma jovem britânica que estudava na Universidade de Perugia foi assassinada. A polícia encontrou Meredith Kercher na cama, mergulhada em sangue e degolada.história vem em todos os jornais italianos e ingleses. Na noite de 1 de Novembro de 2007, uma jovem britânica que estudava na Universidade de Perugia foi assassinada. A polícia encontrou Meredith Kercher na cama, mergulhada em sangue e degolada. As investigações apontaram para três suspeitos: a colega de casa da vítima, uma americana de 20 anos chamada Amanda Knox; o namorado de Amanda, o italiano Raffaele Sollecito; e Rudy Hermann Guede, originário da Costa do Marfim. Os três foram acusados de homicídio, roubo e violação. Guede foi já condenado a 30 anos de cadeia, enquanto o julgamento de Amanda e Raffaele começou este ano.
Amanda, a personagem mais mediática do processo, já deu várias explicações contraditórias. Disse que estava em casa quando ouviu a colega gritar mas que se sentia sonolenta porque tinha fumado marijuana. Disse que foi investigar o que se passava. Disse que não foi. Disse que não se lembra. Os jornais contam que a vítima se disfarçou de vampira na véspera do crime, noite de Halloween, e que teve relações sexuais com Guede. Os outros dois terão então tentado convencer a inglesa a participar num ritual sexual. Ela terá recusado e eles aceitaram mal a recusa. Mas há muitas versões, muitos segredos e mentiras, e a sentença é ainda imprevisível.
Em Janeiro, o tribunal de Perugia foi inundado por mais de duzentos jornalistas. O caso é suficientemente sórdido para fascinar a opinião pública. Mas o motivo de conversa tem sido sobretudo a beleza física de Amanda Knox. "Só sou um alvo porque sou sexy", afirmou a rapariga, que também comentou as muitas cartas de fãs que tem recebido: "Se eu fosse feia receberia cartas de encorajamento? Acho que não." Em tribunal, ela manteve uma presença de espírito e uma bonomia impressionantes. Cumprimentou o ex-namorado ("ciao, come stai?") e disse que ele ficava bem de cabelo curto. Raffaele, contam os jornalistas, corou. Amanda não se intimidou com os fotógrafos que a apanhavam de todos os ângulos, sorriu com aquela expressão adolescente e lasciva, brincou com os seus advogados e com a intérprete. O jornal italiano Il Messaggero escreveu que ela é "uma estranha mas fascinante mistura de femme fatale e inocente de rosto angélico". Estranha mas fascinante.
Nascida em Seattle, filha de pais burgueses, Amanda andou num colégio jesuíta. Estudava línguas na Universidade de Washington e foi um ano para Perugia. Num dos muitos escritos que colocou na Internet, parecia encantada com o estilo de vida italiano. Desde que foi presa, mantém um diário, e alguns excertos apareceram na imprensa italiana (La mia prigione). A presumível homicida faz a lista dos seus amantes, confessa saudades várias, conta conversas com o capelão, jura que era amiga da assassinada, descreve a rotina prisional, pede desculpas, garante que está inocente, confia na absolvição, queixa-se dos media que construíram uma "imagem negativa" dela e que se armam em "juízes implacáveis e hipócritas" (até a sisuda Bompiani já publicou um livro chamado Amanda e gli altri). E no entanto ela vive altivamente dessa sua imagem: "As pessoas comportam-se como se eu fosse a mulher mais bonita desde Helena de Tróia."
Não é uma Helena de Tróia, mas as fotos do julgamento são fantásticas. Enquanto os seus defensores divulgam fotografias de uma all-american girl liceal e pacata, as imagens de tribunal transmitem confiança e exibem sedução. Amanda disse que o seu à-vontade a tem prejudicado. Na verdade, o seu à-vontade cativa. As fotografias são um prodígio de casual-chique. Escoltada por polícias feias e esgalgadas, Amanda vai atenta nos seus olhos azuis-metálicos, veste um pullover azul-celeste, uma camisa branca com florzinhas que mostra os braços nus, uma camisola com várias cores horizontais, tem o cabelo solto na sala de audiências, ostenta uma placidez renascentista, contrai os lábios carnudos numa cara divertida, usa um casaquinho grená que lhe acentua os seios, espreita por cima do ombro, sorri para o juiz num friso de polícias encantados. Supostamente, um julgamento é a única circunstância em que ser atraente é prejudicial. Mas digam isso aos fãs, aos juízes e agentes sorridentes, aos duzentos jornalistas e aos fotógrafos, aos cronistas e colunistas. Se ela fosse feia receberia toda esta atenção? Acho que não. Entre acusações e dúvidas, a beleza de Amanda é o único facto provado.
No Público, hoje
pedromexia@gmail.com
A história vem em todos os jornais italianos e ingleses. Na noite de 1 de Novembro de 2007, uma jovem britânica que estudava na Universidade de Perugia foi assassinada. A polícia encontrou Meredith Kercher na cama, mergulhada em sangue e degolada.história vem em todos os jornais italianos e ingleses. Na noite de 1 de Novembro de 2007, uma jovem britânica que estudava na Universidade de Perugia foi assassinada. A polícia encontrou Meredith Kercher na cama, mergulhada em sangue e degolada. As investigações apontaram para três suspeitos: a colega de casa da vítima, uma americana de 20 anos chamada Amanda Knox; o namorado de Amanda, o italiano Raffaele Sollecito; e Rudy Hermann Guede, originário da Costa do Marfim. Os três foram acusados de homicídio, roubo e violação. Guede foi já condenado a 30 anos de cadeia, enquanto o julgamento de Amanda e Raffaele começou este ano.
Amanda, a personagem mais mediática do processo, já deu várias explicações contraditórias. Disse que estava em casa quando ouviu a colega gritar mas que se sentia sonolenta porque tinha fumado marijuana. Disse que foi investigar o que se passava. Disse que não foi. Disse que não se lembra. Os jornais contam que a vítima se disfarçou de vampira na véspera do crime, noite de Halloween, e que teve relações sexuais com Guede. Os outros dois terão então tentado convencer a inglesa a participar num ritual sexual. Ela terá recusado e eles aceitaram mal a recusa. Mas há muitas versões, muitos segredos e mentiras, e a sentença é ainda imprevisível.
Em Janeiro, o tribunal de Perugia foi inundado por mais de duzentos jornalistas. O caso é suficientemente sórdido para fascinar a opinião pública. Mas o motivo de conversa tem sido sobretudo a beleza física de Amanda Knox. "Só sou um alvo porque sou sexy", afirmou a rapariga, que também comentou as muitas cartas de fãs que tem recebido: "Se eu fosse feia receberia cartas de encorajamento? Acho que não." Em tribunal, ela manteve uma presença de espírito e uma bonomia impressionantes. Cumprimentou o ex-namorado ("ciao, come stai?") e disse que ele ficava bem de cabelo curto. Raffaele, contam os jornalistas, corou. Amanda não se intimidou com os fotógrafos que a apanhavam de todos os ângulos, sorriu com aquela expressão adolescente e lasciva, brincou com os seus advogados e com a intérprete. O jornal italiano Il Messaggero escreveu que ela é "uma estranha mas fascinante mistura de femme fatale e inocente de rosto angélico". Estranha mas fascinante.
Nascida em Seattle, filha de pais burgueses, Amanda andou num colégio jesuíta. Estudava línguas na Universidade de Washington e foi um ano para Perugia. Num dos muitos escritos que colocou na Internet, parecia encantada com o estilo de vida italiano. Desde que foi presa, mantém um diário, e alguns excertos apareceram na imprensa italiana (La mia prigione). A presumível homicida faz a lista dos seus amantes, confessa saudades várias, conta conversas com o capelão, jura que era amiga da assassinada, descreve a rotina prisional, pede desculpas, garante que está inocente, confia na absolvição, queixa-se dos media que construíram uma "imagem negativa" dela e que se armam em "juízes implacáveis e hipócritas" (até a sisuda Bompiani já publicou um livro chamado Amanda e gli altri). E no entanto ela vive altivamente dessa sua imagem: "As pessoas comportam-se como se eu fosse a mulher mais bonita desde Helena de Tróia."
Não é uma Helena de Tróia, mas as fotos do julgamento são fantásticas. Enquanto os seus defensores divulgam fotografias de uma all-american girl liceal e pacata, as imagens de tribunal transmitem confiança e exibem sedução. Amanda disse que o seu à-vontade a tem prejudicado. Na verdade, o seu à-vontade cativa. As fotografias são um prodígio de casual-chique. Escoltada por polícias feias e esgalgadas, Amanda vai atenta nos seus olhos azuis-metálicos, veste um pullover azul-celeste, uma camisa branca com florzinhas que mostra os braços nus, uma camisola com várias cores horizontais, tem o cabelo solto na sala de audiências, ostenta uma placidez renascentista, contrai os lábios carnudos numa cara divertida, usa um casaquinho grená que lhe acentua os seios, espreita por cima do ombro, sorri para o juiz num friso de polícias encantados. Supostamente, um julgamento é a única circunstância em que ser atraente é prejudicial. Mas digam isso aos fãs, aos juízes e agentes sorridentes, aos duzentos jornalistas e aos fotógrafos, aos cronistas e colunistas. Se ela fosse feia receberia toda esta atenção? Acho que não. Entre acusações e dúvidas, a beleza de Amanda é o único facto provado.
No Público, hoje