quinta-feira, dezembro 01, 2005
PROVEDORIAS 1
Com atraso, a crónica de 2a feira, no DN.
A CNN do século XXI?
José Carlos Abrantes
De manhã, um editor do The Guardian revela ao leitor coberturas previstas para o dia
“Blogo porque quero existir”. Esta entrada de um blogue traduz o sentir de milhões de criadores de blogues. Outras motivações existirão pois a diversidade humana também se reflecte, necessariamente, neste domínio. A explosão dos blogues tem levantado algumas interrogações sobre o seu papel. Nos media, tem-se discutido, sobretudo, se os blogues são ou não jornalismo. Uma corrente considera que a actividade jornalística está ao alcance de todos pois existe hoje a possibilidade de seguir os acontecimentos, de recolher informação sobre eles e de a publicar nas páginas dos blogues. Outros consideram que a actividade jornalística é uma actividade institucional onde os controlos são múltiplos: um texto, mesmo de um director, é visto por outros profissionais antes de ser editado. Estes controlos múltiplos dariam, ao jornalismo, fiabilidade e credibilidade, que os blogues, não poderiam reivindicar pois são formas de expressão imediatas. (1).
Alguns jornais alojaram blogues dos seus jornalistas, mesmo de leitores. É o caso do Le Monde ou The Guardian. No jornal francês os assinantes da edição electrónica do jornal podem instalar os seus blogues na plataforma para tal efeito criada. Existe uma carta reguladora e regras de conduta que os bloguers devem respeitar. Há três condições mínimas requeridas: além da assinatura, os internautas devem ter 18 anos ou mais (ou autorização paterna, se menores) e uma direcção electrónica válida. O conteúdo é da responsabilidade exclusiva do criador. Há comportamentos proibidos tais como as actividades ilegais, nomeadamente a cópia ou não distribuição autorizada de softwares, de fotografias e de imagens. É também proibida a propaganda para fins profissionais ou comerciais, bem como a cópia parcial ou total dos conteúdos do sítio do Le Monde. O jornal reserva-se o direito de retirar os blogues em caso de violação das regras existentes. Há blogues em francês, mas também em português (Brasiléia Desvairada, Impressions du Brésil par un brésilien, por exemplo) ou alemão (Sepp in Europa), como ainda noutras línguas. Há também blogues da alguns jornalistas do Le Monde. O jornal inglês The Guardian tem um newsblogue, com entradas noticiosas. Este newsblogue é dinamizado por jornalistas e editores. Numa entrada recente explica-se uma nova iniciativa: logo pela manhã, um editor do The Guardian revela aos leitores algumas das coberturas previstas durante o dia e informa sobre as discussões editoriais que vão decorrendo na redacção. Os leitores ficam assim com a possibilidade de avançarem informações, comentários e sugestões sobre a matéria noticiosa. O El País também permite desde há pouco tempo que os leitores possam corrigir notícias que estão colocadas on line.
Aproveitando a ligação à ONO (Organisation of News Ombudsman) solicitei em Outubro aos provedores da organização que se pronunciassem sobre a ligação entre os media e os blogues, nos orgãos onde exercem actividade. Um deles, Tjeu van Ras, do Brabants Dagblad, Holanda afirmou: “Estamos agora a começar com os weblogues. Eu sou o primeiro o fazê-lo. ).... No ano que vem estamos a planear abrir mais blogues de colegas e também de leitores do nosso jornal.”
Um outro jornal The Post and Courier, de Charleston, abriu um blogue durante um festival de arte que durou três semanas. “O director (executive director) considerou que tinha sido um grande sucesso.” E, entre outras coisas, tencionam ter muita atenção aos bloguers locais, “não para os controlar, dirigir ou explorar, mas porque a blogosfera local é uma “comunidade de leitores” a que nos queremos juntar e também encorajar.”
O provedor de outro jornal americano escreveu: “Descobrimos recentemente que vários jornalistas do Orlando Sentinel's têm os seus próprios blogues. Nada no actual código de ética do jornal se refere a este assunto. Porque um desses blogues levantou objecções de leitores chamando a atenção do jornal, o Orlando’s Sentinel está a estudar essa questão e planeia regular sobre o assunto na próxima revisão do código de ética.”
Em Portugal alguns jornalistas alimentam blogues, juntando às informações que veiculam, fortes cargas opinativas. Mas não parece haver objecções à sua existência. Talvez porque os autores saibam destrinçar com rigor entre o seu papel como jornalistas e como autores de blogues. Blogo porque quero existir será eventualmente mais apropriado do que blogo porque quero informar para a maioria dos milhões de blogs já existentes. Isso não impede que alguns blogs dêm informações detalhadas, originais, com uma evidência de pressupostos ou de juízos, que as “máquinas” dos media tradicionais perderam com frequência. Os blogues, quer se queira quer não, estão a obrigar a pensar os modos de fazer e de consultar informação. E os antigos leitores tornaram-se também produtores de informação própria, recolhem, analisam, comentam, criticam, sugerem, antecipam. Criando informação um campo mais largo que o jornalismo. Se não houvesse mais razões estas bastariam para que a imprensa e os media, em Portugal, olhem com mais atenção a blogosfera. Para que façam um esforço de escuta, de incorporação, de integração, de assimilação.
(1) Será que um blogue pode ser editado? Esta questão agitou em Setembro o Sacramento Bee, outro jornal americano. Um do seus jornalistas, Daniel Weintraub é autor, desde Abril, de um blogue (California Insider). Em Setembro uma directiva do jornal obrigou a que as entradas escritas fossem presentes a um editor antes de publicadas. Fortes críticas surgiram, mas nem o autor nem o provedor do jornal consideraram trata-se de uma censura ou intromissão injustificada.
BLOCO NOTAS
Blog Story
É o título de um livro publicado em França e que já está em segunda edição (Paris, Eyrolles, 2004). Os autores são Cyril Fievet e Emily Turretini, ele jornalista, ela editora de um sítio e também autora de blogues. O livro desenvolve 10 razões para blogar e contém também algumas indicações práticas.
Blogues versus media
A 5ª razão, de onde adaptei o título desta crónica interroga se os blogues serão a CNN do século XXI. Os autores consideram aquilo que parece uma evidência: mais do que a oposição ou a concorrência, os blogues seriam, em geral, meios complementares ao jornalismo. Muitas vezes, dizem, os leitores de blogues têm tudo a ganhar ao lerem um blogue que combina uma informação retirada de uma fonte jornalística a que é acrescentado um comentário de um especialista. E depois tentam ver algumas diferenças entre os blogues e os media.
Diferenças
Os elementos que utilizam para esta diferenciação são as audiências, a qualidade e a verdade, e a deontologia e objectividade. Nas audiência um traço distintivo reside nas maiores audiências dos media, em geral. No entanto, há blogues que registam centenas de milhar de visitas, o que torna mais complexa esta distinção. A amplificação das ideias e entradas de uns blogues por outros leva os autores aconsiderar que os critérios de medida não podem ser exactamente os mesmos.
Qualidade e verdade
“Globalmente, parece-nos um erro julgar que apenas os media têm qualidade e verdade. Um blogue também pode ser fiável, porque publicado por um autor preocupado com a qualidade daquilo que produz, porque resulta de um processo colaborativo diferente daquele que se acciona na imprensa, mas igualmente e de forma paradoxal, porque este não sofre de nenhum dos constrangimentos impostos à imprensa.”
Deontologia e objectividade ? “Os media distinguem-se pelo respeito da deontologia que leva, nomeadamente, a apresentar informações objectivas, veridicas e conformes à lei. “ Os autores referem depois que alguns tentam aplicar estes princípios aos blogues. “Tais tentativas parecem-nos absurdas”, dizem. Um autor de um blogue não pode aderir a um codigo deontológico que ternda a impôr a objectividade como uma vertude, dizem. “Trata-se mesmo do inverso. Um blogue é, muito frequentemente, redigido na primeira pessoa do singular. Assim o blogue constitui a expressão pessoal de um indivíduo e o seu interesse vem precisamente da liberdade que se concede a este indivíduo, no respeito da lei evidentemente, quanto ao que ele escolhe, diz e publica.”
Escreva
Escreva sobre a informação do DN para provedor2005@dn.pt
Para outros assuntos : dnot@dn.pt
Com atraso, a crónica de 2a feira, no DN.
A CNN do século XXI?
José Carlos Abrantes
De manhã, um editor do The Guardian revela ao leitor coberturas previstas para o dia
“Blogo porque quero existir”. Esta entrada de um blogue traduz o sentir de milhões de criadores de blogues. Outras motivações existirão pois a diversidade humana também se reflecte, necessariamente, neste domínio. A explosão dos blogues tem levantado algumas interrogações sobre o seu papel. Nos media, tem-se discutido, sobretudo, se os blogues são ou não jornalismo. Uma corrente considera que a actividade jornalística está ao alcance de todos pois existe hoje a possibilidade de seguir os acontecimentos, de recolher informação sobre eles e de a publicar nas páginas dos blogues. Outros consideram que a actividade jornalística é uma actividade institucional onde os controlos são múltiplos: um texto, mesmo de um director, é visto por outros profissionais antes de ser editado. Estes controlos múltiplos dariam, ao jornalismo, fiabilidade e credibilidade, que os blogues, não poderiam reivindicar pois são formas de expressão imediatas. (1).
Alguns jornais alojaram blogues dos seus jornalistas, mesmo de leitores. É o caso do Le Monde ou The Guardian. No jornal francês os assinantes da edição electrónica do jornal podem instalar os seus blogues na plataforma para tal efeito criada. Existe uma carta reguladora e regras de conduta que os bloguers devem respeitar. Há três condições mínimas requeridas: além da assinatura, os internautas devem ter 18 anos ou mais (ou autorização paterna, se menores) e uma direcção electrónica válida. O conteúdo é da responsabilidade exclusiva do criador. Há comportamentos proibidos tais como as actividades ilegais, nomeadamente a cópia ou não distribuição autorizada de softwares, de fotografias e de imagens. É também proibida a propaganda para fins profissionais ou comerciais, bem como a cópia parcial ou total dos conteúdos do sítio do Le Monde. O jornal reserva-se o direito de retirar os blogues em caso de violação das regras existentes. Há blogues em francês, mas também em português (Brasiléia Desvairada, Impressions du Brésil par un brésilien, por exemplo) ou alemão (Sepp in Europa), como ainda noutras línguas. Há também blogues da alguns jornalistas do Le Monde. O jornal inglês The Guardian tem um newsblogue, com entradas noticiosas. Este newsblogue é dinamizado por jornalistas e editores. Numa entrada recente explica-se uma nova iniciativa: logo pela manhã, um editor do The Guardian revela aos leitores algumas das coberturas previstas durante o dia e informa sobre as discussões editoriais que vão decorrendo na redacção. Os leitores ficam assim com a possibilidade de avançarem informações, comentários e sugestões sobre a matéria noticiosa. O El País também permite desde há pouco tempo que os leitores possam corrigir notícias que estão colocadas on line.
Aproveitando a ligação à ONO (Organisation of News Ombudsman) solicitei em Outubro aos provedores da organização que se pronunciassem sobre a ligação entre os media e os blogues, nos orgãos onde exercem actividade. Um deles, Tjeu van Ras, do Brabants Dagblad, Holanda afirmou: “Estamos agora a começar com os weblogues. Eu sou o primeiro o fazê-lo. ).... No ano que vem estamos a planear abrir mais blogues de colegas e também de leitores do nosso jornal.”
Um outro jornal The Post and Courier, de Charleston, abriu um blogue durante um festival de arte que durou três semanas. “O director (executive director) considerou que tinha sido um grande sucesso.” E, entre outras coisas, tencionam ter muita atenção aos bloguers locais, “não para os controlar, dirigir ou explorar, mas porque a blogosfera local é uma “comunidade de leitores” a que nos queremos juntar e também encorajar.”
O provedor de outro jornal americano escreveu: “Descobrimos recentemente que vários jornalistas do Orlando Sentinel's têm os seus próprios blogues. Nada no actual código de ética do jornal se refere a este assunto. Porque um desses blogues levantou objecções de leitores chamando a atenção do jornal, o Orlando’s Sentinel está a estudar essa questão e planeia regular sobre o assunto na próxima revisão do código de ética.”
Em Portugal alguns jornalistas alimentam blogues, juntando às informações que veiculam, fortes cargas opinativas. Mas não parece haver objecções à sua existência. Talvez porque os autores saibam destrinçar com rigor entre o seu papel como jornalistas e como autores de blogues. Blogo porque quero existir será eventualmente mais apropriado do que blogo porque quero informar para a maioria dos milhões de blogs já existentes. Isso não impede que alguns blogs dêm informações detalhadas, originais, com uma evidência de pressupostos ou de juízos, que as “máquinas” dos media tradicionais perderam com frequência. Os blogues, quer se queira quer não, estão a obrigar a pensar os modos de fazer e de consultar informação. E os antigos leitores tornaram-se também produtores de informação própria, recolhem, analisam, comentam, criticam, sugerem, antecipam. Criando informação um campo mais largo que o jornalismo. Se não houvesse mais razões estas bastariam para que a imprensa e os media, em Portugal, olhem com mais atenção a blogosfera. Para que façam um esforço de escuta, de incorporação, de integração, de assimilação.
(1) Será que um blogue pode ser editado? Esta questão agitou em Setembro o Sacramento Bee, outro jornal americano. Um do seus jornalistas, Daniel Weintraub é autor, desde Abril, de um blogue (California Insider). Em Setembro uma directiva do jornal obrigou a que as entradas escritas fossem presentes a um editor antes de publicadas. Fortes críticas surgiram, mas nem o autor nem o provedor do jornal consideraram trata-se de uma censura ou intromissão injustificada.
BLOCO NOTAS
Blog Story
É o título de um livro publicado em França e que já está em segunda edição (Paris, Eyrolles, 2004). Os autores são Cyril Fievet e Emily Turretini, ele jornalista, ela editora de um sítio e também autora de blogues. O livro desenvolve 10 razões para blogar e contém também algumas indicações práticas.
Blogues versus media
A 5ª razão, de onde adaptei o título desta crónica interroga se os blogues serão a CNN do século XXI. Os autores consideram aquilo que parece uma evidência: mais do que a oposição ou a concorrência, os blogues seriam, em geral, meios complementares ao jornalismo. Muitas vezes, dizem, os leitores de blogues têm tudo a ganhar ao lerem um blogue que combina uma informação retirada de uma fonte jornalística a que é acrescentado um comentário de um especialista. E depois tentam ver algumas diferenças entre os blogues e os media.
Diferenças
Os elementos que utilizam para esta diferenciação são as audiências, a qualidade e a verdade, e a deontologia e objectividade. Nas audiência um traço distintivo reside nas maiores audiências dos media, em geral. No entanto, há blogues que registam centenas de milhar de visitas, o que torna mais complexa esta distinção. A amplificação das ideias e entradas de uns blogues por outros leva os autores aconsiderar que os critérios de medida não podem ser exactamente os mesmos.
Qualidade e verdade
“Globalmente, parece-nos um erro julgar que apenas os media têm qualidade e verdade. Um blogue também pode ser fiável, porque publicado por um autor preocupado com a qualidade daquilo que produz, porque resulta de um processo colaborativo diferente daquele que se acciona na imprensa, mas igualmente e de forma paradoxal, porque este não sofre de nenhum dos constrangimentos impostos à imprensa.”
Deontologia e objectividade ? “Os media distinguem-se pelo respeito da deontologia que leva, nomeadamente, a apresentar informações objectivas, veridicas e conformes à lei. “ Os autores referem depois que alguns tentam aplicar estes princípios aos blogues. “Tais tentativas parecem-nos absurdas”, dizem. Um autor de um blogue não pode aderir a um codigo deontológico que ternda a impôr a objectividade como uma vertude, dizem. “Trata-se mesmo do inverso. Um blogue é, muito frequentemente, redigido na primeira pessoa do singular. Assim o blogue constitui a expressão pessoal de um indivíduo e o seu interesse vem precisamente da liberdade que se concede a este indivíduo, no respeito da lei evidentemente, quanto ao que ele escolhe, diz e publica.”
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Escreva sobre a informação do DN para provedor2005@dn.pt
Para outros assuntos : dnot@dn.pt