terça-feira, novembro 21, 2006
A FÁBRICA DO OLHAR Excerto Capítulo XVIII
Capítulo XVIII A INVENÇÃO DE UMA ARQUEOLOGIA Carl Sagan, 1972
A placa de ouro
No dia 2 de Março de 1972, a sonda Pionner 10 é lançada em direcção a Júpiter. Para a NASA, trata-se já de renovar o «gosto pelo espaço», após o fim um tanto triste das missões lunares Apollo. Germina então a ideia de que as sondas, destinadas – depois de concluída a missão a Júpiter – a alcançar outras galáxias, podiam transportar uma imagem da Terra e dos Terráqueos. Esta ideia vem de Carl Sagan, professor na universidade de Cornell, membro de uma equipa de investigação sobre as naves planetárias automáticas da NASA, altamente reconhecido e condecorado pela realização e análise das fotografias do planeta Marte com a sonda Mariner 9. Carl Sagan, convicto de que pode existir vida noutros lugares, consegue persuadir os dirigentes da NASA da urgente necessidade de significar claramente a origem das sondas terrestres aos habitantes de outros mundos. Por sua proposta, a Pioneer 10 transporta consigo uma pequena placa coberta de ouro com 22 centímetros de comprimento e 15 de largura. Quase inalterável, a placa contém desenhos gravados. Transporta uma imagem de nós mesmos destinada a extraterrestres aleatórios.
Na parte direita da placa estão um homem e uma mulher. O olhar desta para o homem é franco e directo. Vigorosamente assente nas suas duas pernas, erguendo a mão direita com a palma para fora, em sinal de boas-vindas, o homem dirige-se aos futuros observadores, leitores e decifradores da placa. Ela, mais pequena, olha na diagonal, na direcção do homem. Uma ligeira desarticulação coloca-a mais atrás. Ambos são louros, jovens e belos; estão nus e de boa saúde. As proporções dos corpos são perfeitas. O cabelo da mulher é liso. O do homem – imberbe – é ligeiramente ondulado, cortado à ocidental.
Contudo, Carl Sagan afirma vigorosamente ter criado figuras multirraciais: o homem e a mulher não seriam louros: a gravura traçada fora a única responsável por tal efeito. A imagem pretende ser neutra, objectiva, clara, simples, compreensível e amistosa. Um traço de união entre nós e «outros». Os traços de cada um dos rostos resultariam da sobreposição dos principais tipos humanos. Estes rostos compósitos, retratos-robô da humanidade, estariam habilitados para falar em seu nome.